Considerações sobre o conceito do blog

O objeto primeiro deste blogue é conceituar a natureza da crise econômica, política e social em curso, através da análise do conteúdo intrínseco da negatividade da forma valor, relação social abstrata que se estabelece e se reproduz através da mercadoria e do dinheiro (mercadoria especial e equivalente geral), suas expressões materializadas, bem como a necessidade inadiável de sua superação como instrumento de emancipação humana e contenção dos crimes ecológicos contra a humanidade e o planeta Terra.

Recomendamos a leitura do artigo "Nascimento, vida e morte da forma valor" como forma
de entendimento do conceito do blogue.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O efeito liquidificador

Já dizia um criativo escritor e dramaturgo brasileiro que “toda unanimidade é burra”. Nunca uma frase encerrou tanta verdade como agora, quando o mundo todo vive sob a égide de um modelo social decadente, que busca no desenvolvimento de sua própria lógica, causa da decadência, a solução para a própria decadência. Os políticos de direita, de centro (????) e de esquerda (????), disputam entre si, a glória de convencer o eleitorado de que suas propostas são as mais eficientes para o desenvolvimento econômico, como forma única de promoção do bem-estar social, e tudo isso dentro de um comportamento que se presume como ecologicamente sustentável. Ninguém ousa questionar o modelo, como servos inconscientes (ou conscientes) da negatividade capitalista, tudo dentro da obediência cega ao insano fetichismo da mercadoria. Segue essa procissão de alegorias do terror conduzida pelos políticos, prepostos do capitalismo, os sindicalistas, os partidos políticos, as instituições do Estado, as associações de classe, as associações de moradores de bairros, as instituições religiosas, os desportistas, as academias. Todos enfim...

Antes, havia, de um lado, a falsa dicotomia entre os capitalistas, cujo espectro abrigava desde os ditadores militares, os keynesianos, indo até os burgueses neo-liberais, e do outro lado, a chamada esquerda, pretensamente anti-capitalista, que abrigava partidos marxistas de vários matizes, socialistas, trabalhistas, ecologistas, sociais democratas, etc. Fora do espectro político, estavam apenas os anarquistas, cuja crítica focava na Estado e na Igreja, que embora sem maior profundidade teórica, intuíam sobre a negatividade da relação social sob a forma-valor e seus construtos jurídicos institucionais e religiosos. Agora, tal dicotomia se esvaiu na inconsistência de sua própria falsidade e desapareceu com a consolidação one world da relação social sob a forma-valor, tida equivocadamente como dado ontológico, natural e ganho civilizador da existência humana. O desaparecimento quase total das economias capitalistas de estado (modelos marxistas tradicionais), em que pese o surgimento retardado de tentativas de ressurreições pontuais pouco significativas desse modelo, trouxe à tona aquilo que antes poucos podiam perceber: todos os estados (capitalistas e marxistas tradicionais) funcionam sob a égide da extração de mais-valia, única forma de reprodução do valor e, assim, se igualam na defesa do “desenvolvimento econômico”, suas essências constitutivas. Mas justamente no seu momento de aparente vitória, o capitalismo atinge o seu ponto de inflexão, onde a reprodução do valor se processa de modo insuficiente para a irrigação do fluxo monetário internacional, fonte causadora do aprofundamento do apartheid social inerente a sua própria forma e à falência do Estado, incumbido de serviços públicos essenciais, existentes apenas como modo de mascarar a incumbência primária do Estado - a regulamentação coercitiva da relação social mercantil.

O aumento do nível de produtividade das mercadorias provoca o aumento localizado da extração da mais-valia relativa e conseqüente diminuição global da massa de mais-valia nos setores primário e secundário da produção de mercadorias, exigido pela corrida da concorrência de mercado, e atingiu um estágio em que: 

a) se tornou proibitiva a produção de mercadorias pelos médios e pequenos produtores, mesmo na chamada economia de subsistência;

b) no setor terciário se observa o mesmo fenômeno, onde somente as grandes cadeias de lojas conseguem a racionalização dos custos operacionais e a barganha de preços para compra e venda de mercadorias, concentrando cada vez mais o capital nas mãos de enormes complexos lojísticos que, mesmo assim, vêm cada vez mais reduzidos os seus espaços de crescimentos mercantis mundo afora. Igual fenômeno se observa em outros setores de serviços em disputa no mercado;

c) embora tenham surgido setores novos de mercado de trabalho, como é o caso da cibernética, de recém-existência, eles não são suficientes para a absorção da grande massa de trabalhadores tornados supérfluos por esse mesmo aumento do nível de produtividade, proporcionado, principalmente, pela introdução da microeletrônica na produção de mercadorias e, inclusive, pela racionalização de procedimentos provocados pelo próprio uso da computação na área de serviços e na produção de mercadorias. Assim, a vida mercantil encontrou o seu ponto de saturação e de inflexão da sua curva existencial. 

Entretanto, como os entes sociais, são, todos, dependentes da intensidade da velocidade da famigerada roda mercantil, como modo de manutenção do cambaleante (des)equilíbrio social sob sua lógica, incluindo-se entre eles o sistema educacional em seus vários níveis e a própria mídia de comunicação, que também está inserida na lógica mercantil, de onde tira o seu sustento existencial econômico, todos, indistintamente, defendem de modo ferrenho o desenvolvimento econômico como apanágio mor do bem-estar social, e ninguém se dispõe a discutir, ou mesmo admitir, a possibilidade de introdução de um outro modo de relação social fora da lógica mercantil. Tal dependência provoca o chamado “efeito liquidificador”, onde todos convergem para um pensar uniforme, conservador, acomodado, temeroso, rendido, suicida e genocida, tentando convencer a si próprio e aos outros de que o desenvolvimento econômico, embora já agora impossível, é a única forma de saída para a crise que se aprofunda mundo afora. Qualquer pessoa que tente criticar a lógica mercantil e sua forma de agir e pensar é tida na melhor das hipóteses como visionário, ou louco sonhador desconectado da realidade, e na pior das hipóteses, como um perigoso defensor do desvirtuamento do “benéfico caráter civilizador” do “benfazejo desenvolvimento econômico”. Entretanto, esse liquidificador tende a dar defeito, sem possibilidade de conserto, cabendo-lhe, apenas, uma substituição por outro modelo, verdadeiramente emancipador...

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