Considerações sobre o conceito do blog

O objeto primeiro deste blogue é conceituar a natureza da crise econômica, política e social em curso, através da análise do conteúdo intrínseco da negatividade da forma valor, relação social abstrata que se estabelece e se reproduz através da mercadoria e do dinheiro (mercadoria especial e equivalente geral), suas expressões materializadas, bem como a necessidade inadiável de sua superação como instrumento de emancipação humana e contenção dos crimes ecológicos contra a humanidade e o planeta Terra.

Recomendamos a leitura do artigo "Nascimento, vida e morte da forma valor" como forma
de entendimento do conceito do blogue.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

A negatividade do trabalho abstrato, uma categoria capitalista


Se um ser humano megalomaníaco e desejoso por acumular dinheiro em proporções inimagináveis, obtivesse uma vara de condão capaz de produzir, incontinenti, mercadorias quaisquer para transformá-las em dinheiro e, assim, as produzisse, ele terminaria por ficar sem dinheiro algum, porque o valor, ou seja, a riqueza abstrata assim constituída, dessubstancializar-se-ia de tal modo, que todo o seu sonho de riqueza abstrata viraria abóbora. Por que isso aconteceria? A resposta a essa pergunta explica todo o momento de crise político/econômica e sócio/ecológica do mundo mercantil da atualidade. O sonho do nosso megalomaníaco seria desfeito justamente porque o trabalho abstrato, substância da forma valor, teria desaparecido do processo de produção, e assim, o próprio valor desapareceria no ar tal qual fumaça na amplidão do universo (efeito estufa a parte). A vara de condão da modernidade é o processo de produção tecnológico de ponta que dispensa o trabalho abstrato substancialmente. O capitalismo (forma-valor desenvolvida) nasce concomitantemente à disseminação do trabalho abstrato e se decompõe com o seu desuso.


A metáfora acima serve para demonstrar que o processo de acumulação do capital nasce no momento da introdução do trabalho abstrato no processo da produção de mercadorias, sendo, portanto, um condicionamento a priori de toda a negatividade da socialização mercantil, que se complementa na circulação dessas mercadorias através das trocas no mercado, elemento complementar indispensável do ciclo de reprodução do valor. Serve, também, para demonstrar que a negatividade da produção de mercadorias tem como função fundamental acumular capital, e não satisfazer necessidades sociais, contradição irresolúvel entre a forma insensível (o valor) e a forma sensível (o objeto concreto). O trabalho abstrato tem sido considerado, equivocadamente, como dado ontológico da existência humana (como, por exemplo, a água o é), e como fator de sua dignidade existencial, inclusive pelo marxismo tradicional, que ontologizou o trabalho abstrato como fonte de emancipação revolucionária e jogou toda a culpa da exploração humana na circulação e produção privada de mercadorias, excluindo de sua crítica a produção do valor sob controle do Estado.

De um modo geral se tem a idéia de que o trabalho é um dado ontológico da vida humana. Acredita-se que ele exista desde que o homem atingiu a sua segunda natureza, a racionalidade, e estabeleceu uma interação metabólica com a natureza no dispêndio de nervos e músculos no sentido dessa produção dos bens naturais de que necessita para a sua sustentação material. Entretanto, não devemos confundir essa atividade humana de produção com a categoria trabalho, cuja essência constitutiva tem outra origem, natureza e razão de ser.

O trabalho tem relação histórica com os regimes de escravidão e servidão, com a relação de poder e acumulação segregacionista de riqueza material, e não com a satisfação de necessidades coletivas. Sob o capitalismo, o trabalho tomou a forma acabada de trabalho abstrato produtor de mercadorias, constituindo-se como substância constitutiva da riqueza abstrata sob a forma-valor e, portanto, uma categoria capitalista. Há, como já dissemos antes, diferença de conteúdo (não apenas semântica) entre atividade humana de interação com a natureza objetivando a satisfação de necessidades humanas e o trabalho abstrato, atividade produtora de mercadorias cujo objetivo teleológico é a reprodução contínua de valor. O trabalho produtor de mercadorias tem dupla referência. É ao mesmo tempo, trabalho concreto que produz um objeto qualquer, e trabalho abstrato que diz respeito a uma quantidade indiferenciada de tempo de dispêndio de nervos e músculos (donde a sua condição apenas quantitativa), coagulado numa mercadoria, expressão materializada da abstração forma-valor. O trabalho concreto remete ao valor de uso, e o trabalho abstrato ao valor de troca das mercadorias, motor do destrutivo e vazio fim em si da autovalorização do valor. Trabalho abstrato e valor são abstrações que tomam forma real sensível na mercadoria (que contém valor de uso e de troca) ou no dinheiro, mercadoria especial e equivalente geral que contém apenas valor de troca.


Assim, o trabalho abstrato é uma criação histórica, não ontológica, com data de nascimento, vida e morte, e a alta produção tecnológico-industrial de mercadorias, ora em curso e gênese do desemprego estrutural, atinge-o de morte. A era do trabalho-valor abstrato está chegando ao fim, e não pode significar o fim da trajetória humana no Planeta Terra. Somente com a superação da forma valor e, consequentemente, do trabalho abstrato, sua substância constitutiva indispensável poderemos ter uma sociedade emancipada e salvarmos os seres humanos e toda a vida animal e vegetal do Planeta da hecatombe, seja pela barbárie ou pela guerra, ou, ainda, seja pela exploração predatória dos recursos naturais associada à emissão de gases poluentes que produzem o seu aquecimento.

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